HH Magazine
Destaque

Cinco artigos sobre a escola dos Annales e suas abordagens historiográficas

A escola dos Annales foi um movimento historiográfico que se constituiu no século XX em torno do período francês Annales d’histoire économique et sociale. Fundada no ano de 1929 por Lucien Febvre e Marc Bloch, a escola buscava combater a visão positivista da história, substituindo o tempo breve dos acontecimentos pelos processos de longa duração. Nas suas décadas iniciais houve assim uma significativa incorporação de métodos das Ciências Sociais que tornaria possível, posteriormente, a expansão da escola aos campos da história da civilização e das mentalidades.

Nos anos de 1960 e 1970, a obra do historiador Fernand Braudel definiu uma segunda geração na historiografia dos Annales. Esse momento foi marcado pela emergência dos temas das civilizações e demografias, aportando uma inovação nos conceitos de tempo e da geo-história. A terceira geração dos Annales, por sua vez, foi composta dos diversos intelectuais que ampliaram consideravelmente o escopo da escola, dentre os quais podemos citar figuras como Jacques Le Goff e Pierre Nora. Foi a partir dessas novas configurações que se desenvolveu então uma concepção histórica mais abrangente, na qual toda atividade humana passaria a ser considerada história. Geralmente conhecida como a Nova História, essa geração teria suas formas mais visíveis nas abordagens sobre a história das mentalidades.

É inegável que, ao privilegiar os métodos multidisciplinares de análise, a escola dos Annales tenha renovado o quadro das pesquisas históricas. Todavia, ainda é bastante complexa a rede de influências que a escola teria recebido e exercido de outras correntes historiográficas. Foi pensando nessas questões que preparamos essa lista com cinco artigos sobre a escola dos Annales e sua abordagem historiográfica. Nessa bibliografia comentada, trazemos indicações de artigos da revista História da Historiografia fundamentais para vislumbrar a complexidade que envolve a temática das contribuições proporcionadas pela escola dos Annales. Os artigos reunidos são leituras que enfatizam a necessidade de refletir sobre a formação desse complexo padrão historiográfico que deixou, e ainda deixa, traços definitivos na história da historiografia.

Confira:

 

1) “Do ponto de vista dos nossos Annales”: a Revista dos Annales e a produção da história econômica e social (1929-1944)

Mariana Ladeira Osés

Entre os muitos feitos notáveis protagonizados pela revista dos Annales, o gerenciamento da longevidade de sua publicação é um dos mais impressionantes. É a partir dessas especificidades de consolidação, que o artigo de Mariana Osés se propõe então a investigar as décadas iniciais de inserção da revista dos Annales na área nascente da história econômica e social.

Para realizar essa análise a autora procede tanto à exposição dessas propostas concorrentes quanto à análise verticalizada dos usos feitos, na seção crítica dos Annales d’Histoire Économique et Sociale, do rótulo “histórica econômica e social”. À luz dessas condições de formulação, o artigo busca avaliar os efeitos da produção dos Annales na disputa por protagonismo no seio da disciplina histórica. O argumento desenvolvido por Osés é de que apesar das ideias que veiculavam não serem inéditas, Marc Bloch e Lucien Febvre produziram um modelo de enunciação distinto e eficaz em sua especialidade disciplinar.

 

2) Entre história das ciências e das religiões: o problema da temporalidade histórica em Lucien Febvre e Alexandre Koyré no entreguerras 

Marlon Salomon

Os textos publicados por Lucien Febvre e Alexandre Koyré no entreguerras, apesar de suas nítidas diferenças, contribuíram significativamente para as definições do que deveria ser a própria história. É com o objetivo de ressaltar a proximidade das questões formuladas pelos historiadores, que Marlon Salomon procura nesse artigo avaliar o que esteve em jogo na constituição dessas duas concepções e delimitar os próprios contornos do problema.

Embora oriundos de fileiras intelectuais distintas, o argumento desenvolvido por Salomon é de que Febvre e Koyré formularam o mesmo tipo de problema, voltando-se contra os mesmos conceitos e opondo-se à mesma tradição historiográfica. Para desenvolver essa análise, o artigo mostra que no centro da problematização desenvolvida pelos dois historiadores encontrava-se uma crítica ao modo como a temporalidade dessa história havia sido definida e a constatação de que ela precisava ser reformada para que a história não fosse falsificada. Nesse sentido, o autor defende a ideia de essas diferentes abordagens historiográficas articulavam de uma nova maneira a relação entre credulidade e racionalidade e definiam o tipo de temporalidade histórica que poderia albergar esse novo modo de articulá-las.

 

3) O trabalho que se faz: a atividade diretorial nos Annales d’Histoire Économique et Sociale (1929-1938)

Mariana Ladeira Osés

A relação estabelecida entre a revista dos Annales e o espaço social dos historiadores é moldada pela posição à qual a revista e seus colaboradores alcançaram após a fundação do periódico. O Artigo de Mariana Osés se propõe assim a retomar o trabalho cotidiano empreendido por Marc Bloch e Lucien Febvre entre 1929 e 1938 a fim de identificar essas condições de produção.

Para realizar essa análise, o artigo de Osés toma por objeto os expedientes de trabalho adotados por Marc Bloch e Lucien Febvre na administração da Revista dos Annales entre 1929 e 1938. O objetivo da autora é demonstrar o potencial das fontes e dos problemas abordados para trazer à luz dimensões menos visíveis, mas não secundárias, do funcionamento da revista em seus primeiros anos e das condições objetivas inscritas nesse funcionamento. A hipótese desenvolvida no artigo é de que a instabilidade à qual os Annales estão submetidos no período é um elemento central para a compreensão de escolhas editoriais tomadas pelos diretores.

 

4) A originalidade historiográfica de La Méditerranée et Le monde méditerranéen à l’épo que de Philippe II e a concepção braudeliana de história 

Guilherme Ribeiro

Podemos dizer que a história humana é, para Braudel, uma história total, que ocorre nas escalas local, regional, nacional e mundial. É levando em consideração o surgimento de uma nova abordagem historiográfica nos Annales que o artigo de Guilherme Ribeiro se debruça, portanto, sobre a originalidade da concepção braudeliana de história.

A partir de La Méditerranée et le monde méditerranéen à l’époque de Philippe II e as críticas a ele endereçada, o artigo procura analisar a originalidade historiográfica do mesmo, reunindo elementos que permitam sustentar a existência de uma concepção braudeliana de História. A questão central a ser desenvolvida por Guilherme Ribeiro é a de que, por mais que a narrativa braudeliana seja descritiva, existe por trás dela um embasamento epistemológico que a sustenta. Nesse sentido, o autor defende o argumento de que tais temas não podem ser vistos separadamente, constituindo, portanto, em conjunto uma história global e não uma história feita exclusivamente por um grupo a partir de um topos privilegiado.

 

5) História e Estruturalismo: Braudel versus Lévi-Strauss

José Carlos Reis

A Antropologia Levi-Straussiana obrigou a história a se colocar algumas questões sobre as articulações entre evento e estrutura, novidade e repetição, consciência e inconsciente, singular e universal, sincronia e diacronia. É diante desse intenso debate entre a Antropologia e a História, que o artigo de João Carlos Reis se debruça sobre as respostas forjadas pelos historiadores do Annales a esses novos moldes do conhecimento histórico.

Para identificar como esse debate entre História e Estruturalismo nas décadas de 1960 e 1970 ressoou entre os historiadores da escola do Annales, Reis analisa a resposta dada por Fernand Braudel à antropologia de Lévi-Strauss. Ao traçar esse debate entre a concepção Levi-Straussiana e a Braudeliana de história, o artigo se desenvolve assim sobre as particularidades da concepção de temporalidade desenvolvida pelos dois historiadores. Nesse sentido, o autor destaca as inúmeras interfaces das pesquisas empreendidas através desse diálogo, buscando evidenciar as apropriações e significações recíprocas entre essas bibliografias, técnicas e problemas de investigação.

 

Leia também na revista História da Historiografia:

SAMPAIO, T. H. Entre tradições historiográficas: um estudo de Georges Duby. História da Historiografia: International Journal of Theory and History of Historiography, Ouro Preto, v. 9, n. 20, 2016. DOI: 10.15848/hh.v0i20.996.

RODRIGUES, L. S. Os Annales e nós. História da Historiografia: International Journal of Theory and History of Historiography, Ouro Preto, v. 7, n. 15, p. 192–198, 2014. DOI: 10.15848/hh.v0i15.712 

MALERBA, J. A velha Nova História. História da Historiografia: International Journal of Theory and History of Historiography, Ouro Preto, v. 6, n. 11, p. 279–286, 2012. DOI: 10.15848/hh.v0i11.507.

 

 

 

[vc_row][vc_column][vc_text_separator title=”SOBRE A AUTORA” color=”juicy_pink”][vc_column_text][authorbox authorid = “269”][/authorbox]

Related posts

A sala de aula e a rua

Sanjay Seth
4 anos ago

Cinco artigos que você precisa ler sobre mulheres intelectuais e a escrita da História

Ilda Renata Andreata Sesquim
3 anos ago

Sete artigos sobre Reinhart Koselleck e o conhecimento histórico

Ilda Renata Andreata Sesquim
1 ano ago
Sair da versão mobile