Na coluna de agosto de 2019, na qual relatei um pouco sobre parte das minhas experiências de pesquisa sobre música pop na história, me propus a trazer, nas publicações futuras, algumas reflexões e possibilidades de estudo. Partindo desta proposta, pensei em iniciar retomando uma leitura que para mim foi fundamental no início da minha trajetória de pesquisa na área, a obra 5 Seconds Of Summer – A Biografia, tendo em vista que inicialmente havia me proposto a analisar as publicações digitais brasileiras sobre a referida banda (juntamente ao grupo Fifth Harmony). Neste sentido, essas “antigas” impressões de leitura são também um registro de uma leitura que, no ano em que realizei, eram bastante iniciais, mas que optei por mantê-las assim para que sirva também como registro de um movimento ainda inicial da pesquisa.
Em 5 Seconds Of Summer – A Biografia, Joe Allan pretende sistematizar e narrar o desenvolvimento da banda australiana 5 Seconds Of Summer e sua emergência até os ano de 2014. Através de bibliografias e fontes midiáticas, como jornais, revistas, sites da internet programas de televisão e rádio Allan constrói uma narrativa sobre a banda em uma perspectiva da trajetória da banda que não se baseia em uma origem, mas sim na emergência, e em um percurso de vida que considera os elementos não apenas sucessivos, mas também os litígios e os percursos na vida dos sujeitos, como é colocado por Bourdieu (1996).
Composta por Luke Hemmings, Calum Hood, Michael Clifford e Ashton Irwin, a banda 5 Seconds Of Summer passou a ficar conhecida ainda em 2011, através de um canal do youtube criado por Luke Hemmings para que ele, sozinho, publicasse videos seus realizando covers de músicas conhecidas. Porém, de acordo com Allan, o 5 Seconds Of Summer, começaria oficialmente a tomar formar através das rodas de músicas realizadas por Luke, Michael e Calum na Norwest Christian College, instituição frequentada pelos garotos. Se possuir um laço de amizade antes de começarem a se reunir nos intervalos da escola com seus instrumentos, o pesquisador afirma este poderia ser um considerado enquanto um dos marcos principais na trajetória da banda e em sua formulação.
Iniciando sua carreira através dos meios digitais, reaproveitando o canal de Luke Hemmings, e utilizando as práticas de compartilhamento de histórias e mídias online, o grupo começou a conseguir seus primeiros show e, logo no inicio de sua carreira fora do meio digitais incluiram Ashton Irwin enquanto baterista oficial. Esta é a história tratada pelo autor até o capítulo seis do livro, que em sua totalidade possui dezesseis.
A partir do sétimo capítulo o autor busca vincular e articular a atuação da banda no cenário internacional e no contato, especificamente, com um outro grupo de garotos que no momento despontava: a Boyband One Direction. É, de acordo com Allan, justamente a aproximação e um processo de “apadrinhamento” do 5 Seconds Of Summer pelo One Direction que conseguiu afirmar a banda e garantir a permanência da banda em cenário internacional, afinal, desde 2011 até 2014 a banda sairia em duas mais de duas turnês internacionais e virariam capa de inúmeras revistas sem ter, até o momento, lançado oficialmente nenhum CD.
Através do estudo de fontes midiáticas, articulado a fatores como momento (contexto), o autor se aproxima da abordagem de Sabina Loriga (2011), buscando relacionar o sujeito e/ou a banda biografado/a, aqui nomeado “a”, com o contexto vivido, definida aqui como “y”, afinal sua vida não se exclui ou é vivida apenas pelo sujeito. Deste modo, a autora propõe que uma escrita biografia seguiria um modelo, que é aplicado por Allan, onde A(biografia) = a+y. Tal questão é fundamental especialmente no que diz respeito aos estudos recentes sobre cultura pop e música pop no campo da história. Estudos nos campos da Comunicação e da Mídia (BOTTON, 2015) já consolidados, costumam afirmar que a partir da metade do século XX existe uma alteração no status do termo celebridade assim como do conceito de pop, contudo, os estudos historiográficos sobre o campo ainda são poucos desenvolvidos dentro do campo da própria história. Outra alteração é novamente percebida a partir do século XXI e a emergência da internet e dos veículos de autodivulgação e acompanhamento virtual da vida, deste modo, existe ai um convite para estudos tais quais o de Joe Allan, que busquem problematizar a atuação dos veículos midiáticos na construção biográfica de grupos de música e, das consideradas celebridades.
Em sua narrativa, Allan, poderia inclusive ser enquadrado dentro do campo da História Pública, uma vez que, este não apenas realiza uma história que rompe com as algumas exigências narrativas acadêmicas, sem perder o rigor de uma pesquisa cientifica pesquisa, mas também, conforme Santhiago (2016), busca uma produção da história aliando as dimensões do público com a história, assim como a produção de narrativas pelos públicos. Outro elemento fundamental é a ocupação de fontes midiáticas e da comunicação que, segundo Barbosa (2016), no exercício de uma escrita cotidiana, em especial no caso do estudo sobre a banda 5 Seconds Of Summer, além de utilizar-se do passado e notificar o presente, e o passado recente, atua/ou na seleção de acontecimentos que interferem e, inclusive, determinam a escrita futura e recente sobre a história da banda.
O estudo de Allan pode ser inserido em uma perspetiva da história do tempo presente, mas especificamente em uma investigação acerca do passado recente de um grupo, que possui ecos tanto na atualidade quanto é entrecruzado por estratos de tempo (DOSSE, 2012). Ao problematizar e narrar a trajetória da banda o autor buscou não apenas incluir os percursos e problemas no caminho, demonstrando uma não linearidade constante na carreira do grupo, mas também expressar de que maneiras grupos anteriores e a própria sociedade influenciam a 5 Seconds of Summer. Conforme indicado na obra, o grupo constantemente foi associado ao ramo do “pop music” e como uma boyband, sendo inclusive muito aproximado dos seus Padrinhos One Direction, o que conforme próprios integrantes nos veículos de comunicação encaram enquanto algo próximo de uma ofensa e de um desconhecimento do repertório da banda.
A obra de Allan se constitui assim não apenas enquanto uma das primeiras biografias e tentativas de sistematizações de informações sobre a banda 5 Seconds Of Summer, mas também enquanto um fonte e um livro privilegiado para os interessados pelos debates de História da Música Pop, História do Tempo Presente e, principalmente, a História Pública.
REFERÊNCIAS
ALLAN, Joe. 5 Seconds of Summer: A Biografia. Rio de Janeiro: BestSeller, 2015.
BARBOSA, Marialva. Imprensa e História Pública. MAUAD, Ana Maria; ALMEIDA, Janiele Rabêlo de; SANTIAGO, Ricado (Org). História Pública no Brasil: Sentidos e Intinerários. São Paulo: Letra e Voz, 2016. p. 121-131.
BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: AMADO, Janaína; FERREIRA, Marieta de Moraes (Org.). Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Editora da FGV, 1996, p.183-191.
BOTTON, Alain de. Notícias: Manual do Usuário. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2015.
DOSSE, François. História do Tempo Presente e Historiografia. Tempo e Argumento, Florianópolis, v. 4, n. 1, p.5-23, jan/jun 2012. Disponível em: <http://revistas.udesc.br/index.php/tempo/article/view/2175180304012012005/2014>.
LORIGA, Sabrina. O Pequeno X: Da biografia à história. Belo Horizonte: Autência, 2011.
SANTHIAGO, Ricardo. Duas Palavras, Muitos Significados: Alguns comentários sobre a história pública no Brasil. MAUAD, Ana Maria; ALMEIDA, Janiele Rabêlo de; SANTIAGO, Ricado (Org). História Pública no Brasil: Sentidos e Intinerários. São Paulo: Letra e Voz, 2016. p. 23-36.
Créditos na imagem: 5 Seconds of Summer. Reprodução Instagram.
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Igor Lemos Moreira
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