Um edifício uma cidade

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O Copan é meu sertão. / De ser tanto / é meu sertãocopan. / O Copan é comoção. / muito além do Café Floresta. / No Copan, iniciei praticamente / uma vida. / Aquela vila onde morou / Patrício Bisso, / entre inúmeros artistas / (e ainda moram). / Copan é a diversidade / densa, / por isso floresta, por isso mata. / Copan e os povos da mata / da Cidade de São Paulo.

A epígrafe que inicia esta crônica, talvez fosse, em síntese, meu sentimento pelo Edifício Copan. Não que tenha muito mais para escrever sobre essa construção arquitetônica. Sobre este ornato da paisagem urbana da cidade de são Paulo.

Historiadores e urbanistas podem falar mais e melhor do que eu sobre o edifício Copan.

Eu poderia fazer uma pesquisa, que fosse breve, rápida, ligeira, no Google. Encontraria fotografias e dados textuais sobre o edifício. Minha disposição não está para tanto. Minha inclinação de caráter, embora pesquisador eu seja, e daqueles que trabalham com afinco, não está para isso.

O Edifício Copan está ali, no centro de São Paulo. Quase na esquina da Consolação com Ipiranga. Ele está fincado próximo ao Edifício Redondo, ao Teatro de Arena (Eugênio Kusnet).

Prometi não ser urbanista. Eu fui, ao que me lembre, ao Copan, pela primeira vez, não tinha nem 18 anos. Eu fazia um curso de teatro, uma oficina para atores no SESC Consolação, que a gente chamava, naquele tempo (anos 80) de SESC Vila Nova. Antunes Filho nem havia ainda criado o CPT (Centro de Pesquisas Teatrais), mas estava na iminência de fazer isso. As aulas de teatro eram uma vez por semana, à noite. Eu ia com um primo. A gente ia rindo de ônibus de Santana até o SESC. Voltávamos tortos e rindo mais ainda. E tinha o Copan entre as aulas e o estar em casa de volta.

Terminada a aula de teatro, eu e meu primo íamos a pé em direção do ponto de ônibus, mas antes, como ele tinha um amigo que morava no Copan, num dos blocos em que os apartamentos são quitinetes, visitávamos o amigo dele. Era uma visita cordial, mas era pra gente beber uns copos também.

Durante um semestre, uma vez por semana eu ia às aulas de teatro e beber depois no Copan. A gente descia o elevador rindo muito. Quanto mais a gente tentasse disfarçar, mais a gente ria. A gente bebia cerveja. O amigo de meu primo tinha sempre nos oferecia cerveja que ele trazia do Maranhão. Não sei se invento ou se só de lembrar já fiquei meio alto.

Muitos anos depois, não ia ao Copan mais para beber. Ia porque meu irmão não de sangue ia. Eu ia junto, porque a gente andava junto, e fazia tudo junto. A mãe dele tinha uma loja de roupas de crianças na parte comercial do Copan. E a irmã de sangue dele também teve uma loja lá, onde vendia roupas de sua confecção. Eu adorava tomar café na loja cujo pó de café vem de Santos. Gostava também de passear e ver vitrines.

O Edifício Copan parece uma cidade dentro da cidade. Para além de ter vários blocos de apartamentos de tamanhos e tipos diferentes, no térreo há lojas. Havia um cinema, que virou igreja cristã dessas reformadas. Na parte externa do edifício, há restaurantes e bares, em seu anexo há restaurante.

Cheguei a ir ao Copan porque a veterinária do Pqno, meu cão cairn terrier, e do William, tinha loja e clínica lá. Isso foi nos primeiros anos de vida do Pqno. Essa veterinária, mas a dedicação do William e minha salvaram o Pqno quando bem filhote. Ele veio com uma baita de uma tosse de canil.

Depois, teve vezes em que eu e William íamos visitar a Paula, que se mudou para uma quitinete charmosa de um dos blocos do Copan. A gente chegava torto e saía torto, viajando, dando risada.

O Copan, para além dessas histórias, que são pouco ou quase nada, imagine o leitor quantas histórias há ali, no edifício-cidade, construído segundo um princípio sociológico da diversidade, orna São Paulo.

Nunca subi a seu topo, ao cume do edifício. Estive num outro, no topo e pude vê-lo do alto, mais alto que seu alto majestoso. Estive no Edifício Eiffel. Era noite. As luzes sobre o Minhocão permitiam a gente ver o traçado de rio do elevado Costa e Silva, esse nome de ditador, hoje é chamado João Goulart. As janelas acessas, alternadas com as apagadas dos blocos do Copan, faziam uma beleza cinza e poluída, uma beleza bem bela. Eu estava no Eiffel, mas desejava o Copan, o meu sertão.

 

[No próximo dia 25 de janeiro, a cidade de São Paulo fará 466 anos de fundação. Esta crônica é minha homenagem à cidade chamada de “cidade macota” por Mário de Andrade]

 

 

 


Créditos na imagem: Reprodução. Disponível em:https://vejasp.abril.com.br/blog/memoria/edificio-copan-historia/

 

 

 

SOBRE O AUTOR

Eduardo Sinkevisque

Eduardo Sinkevisque é doutor em Letras: Literatura Brasileira (FFLCH/USP). É sócio-fundador da Sociedade Brasileira de Retórica. Publicou o e-book Mar dos Dias (Árvore Digital, 2018). Publicou o livro Tratado Político (1715) de Sebastião da Rocha Pita - Estudo Introdutório, transcrição, índices, notas e estabelecimento do texto por Eduardo Sinkevisque (EDUSP, 2014). Foi pesquisador Residente na Fundação Biblioteca Nacional, cuja pesquisa foi em diários. Eduardo publica textos em seu blog, o blogmenos (www.blogmenos.tumblr.com) e colabora em várias revistas acadêmicas e literárias. Trabalha em consultoria de texto e de pesquisa na área de Humanas. Para contactá-lo: instagram @dudasinke e email esinkevisque@hotmail.com.

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