Certa vez o filósofo esloveno Slavoy Zizek afirmou que a humanidade imagina mais de mil tipos de apocalipses do mundo, mas não consegue imaginar uma maneira de romper com o capitalismo. De meteoros que sobrevoam o centro de Manhattan, ondas enormes que a tudo engolem, E.T’s de todas as cores, tipos, formatos e destinos, deuses tão variados quanto os E.T’s, chuva de fogo, trombetas que tocam nos quatro cantos do mundo, buraco negro que se abre em um bunker, monstros devoradores de humanos até cientistas e robôs que colocam tudo e todos no epicentro de catástrofes incontroláveis. Poderia passar tantas outras linhas sugerindo apocalipses, mas no fundo chegaria sempre à mesma conclusão: após todo o quadro apocalíptico retorna-se e louva-se a mesma ordem anteriormente estabelecida. Os mesmos voltam a governar [com outras roupas], os mesmos voltam a ditar as regras [com outros discursos], os mesmos voltam a servir [com outras ilusões]. Todo o caos e a destruição dos apocalipses possuem a intencionalidade de indicar que o melhor é ficar como sempre ficamos. É melhor que os mesmos continuem sendo explorados e que os mesmos continuem explorando do que terminarmos todos exterminados por E.T’s. Os filósofos espanhóis Carlos Fernández Liria e Santiago Alba afirmaram algo assemelhado ao discutirem sobre estas mudanças que restabelecem o mesmo no que diz respeito aos governos [também apocalípticos]: quando matam ou intimidam a todos os que têm a intenção de continuar votando no lado errado, dez, trinta ou quarenta anos depois, a democracia é restaurada. É a chamada pedagogia dos milhões de mortos: a cada quarenta anos, mais ou menos, quase todo mundo é morto e depois os sobreviventes podem votar.

O caso das queimadas na Amazônia é um bom exemplo do apocalipse que se constrói para que depois tudo volte ao ordenamento apodrecido de antes. Imaginam-se mil tipos de salvar a Amazônia, mas não se efetiva uma maneira de romper de vez com este ordenamento exploratório da natureza. Desde orações que rogam aos divinos por uma solução, rebolar de calcinha em prol da Amazônia, postar fotos de incêndios na Índia e no Rio Grande do Sul como se fossem a Amazônia, fotos de incêndios na mesma Amazônia já nos anos 1989, 2014, 2017, envio de aviões e brigadas de todo canto do mundo até discursos de países imperialistas e colonialistas querendo dar lições de como preservar a natureza por eles mesmos explorada, destruída e roubada. Poderia passar tantas outras linhas narrando tipos de salvação que foram dadas, mas no fundo chegaria sempre à mesma conclusão: após o controle da atual queimada da Amazônia retorna-se e louva-se a mesma ordem anteriormente estabelecida. É melhor que os mesmos continuem explorando e enriquecendo com o desmatamento da Amazônia do que se atentar àquilo que o jornal espanhol El país chamou da eterna catástrofe na Amazônia. É o que chamo de pedagogia do fogo: a cada ano queimam-se milhares de hectares e depois se evoca uma crise internacional para que a solução seja a de manter tudo como era antes [exploratório, mas sem fogo].

 

 

 


Crédito da imagem: ©2019 Victor Moriyama / Greenpeace

 

 

 

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