Pobreza franciscana

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Essa terra é seca como o cão e com todo respeito peço desculpa aos magros cães que rondam essa terra quebrada.

A terra é tão seca que esturrica até as ramas do cipó grosso que corria ao redor da árvore retorcida pelas suas necessidades. As pedras que esquentam feito brasa e chega a fazer a borracha das sandálias franciscanas federem borracha queimada e já se tornou comum ver as crianças andando pulando pelas estradas e falando: Tá quente!

Calor da peste, do grande sertão desaguado e com chuvas tão poucas que quando chove é motivo de festa e as gotas sambam nos telhados das cazinhas e na cabeça da gurizada. Quando a chuva cai parece o fim do mundo, ninguém liga com nada, só querem ver a água caindo e agarrar com os olhos as cenas encharcadas, ah! Essa vida é uma história que possui duas partes, uma é nascer nutrido e a outra é morrer seco, feito bicho do mato e mal tratado pelo destino e sufocado pela poeira do tempo.

Francisco, sobrenome Alvez, feição largada, de pés e mãos gigantes, um verdadeiro Abaporu . Nessa terra se não for cabra brabo, não sobrevive não, a gente não vive, a gente segue o instinto: Buscar água, comer, nesse mundão de meu deus, travamos uma corrida com a morte e ela corre feito vaca braba e nois corre feito calango com os pés queimando, mas o bom disso tudo é que calango sobe em barraco, a vaca não… Grazadeus! Não sou o único franciscano, minha terra é toda de franciscos e todos iguais na pobreza, nos poucos anos de vida. Os bebês tão nascendo antes dos noves meses, será que é pra viver mais? Não sei, o doutor disse que isso é perigoso, mas o que vamos fazer se essa mocidade não aguenta esperar.

Mas triste mesmo é as histórias desses cantos mal conhecidos, como a daquel Zeca que batia na muiê e já matou um dos fio antes mesmo dele sair da fábrica. A vida é dura e às vezes a vaca pega o calango antes meso de ele aprender a correr. Só via gente chorando, havia água no momento, porém não era de chuva. A infelicidade daquela franciscana e do franciscaninho. Caixaozinho pequeno, parecia uma gaveta.

Se bem que mais tarde dei falta da última gaveta de meu criado, não liguei com isso, amanhã posso precisar de um criado inteiro, se é que toda roupa velha quando bem dobrada cabe forgada e ainda sobra espaço pro escapulário. Essa terra minha, parece angu seco, cheio de trincados pelo calor cozinhante, mas agora o jogo virou e é a terra que come a gente. Somos vários que se juntam num só corpo: O sertão. Onde só vive cabra babo, que aprendeu a viver com o pouco e ver no pouco o muito, carregando a esperança no peito e a força nos braços e na voz cantarolando por esse sertão afora.

 

 

 


Créditos na imagem: Gitarzysta, arte de, José Ferraz de Almeida Júnior.

 

 

 


SOBRE O AUTOR

Phablo Alves Vieira

Chamo-me Phablo Vieira tenho 19 anos e sou estudante de Jornalismo pela UFOP. Sempre admirei a arte de escrever, a poética envolvida e as críticas que podemos desenvolver constantemente. Sempre gostei de participar de atividades literárias, de debates, enfim dessa gama de diálogos que podem ser desenvolvidos e que conectam um indivíduo ao outro e que carregam reflexões e pontos de vistas diversos. Sou amante do Flâneur e gosto de observar o invisível que não deveria ser invisível. Gosto da filosofia do hoje, admiro a do ontem e por isso não me preocupo tanto com o amanhã.

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