A Engenharia da Solidão

0

 

.

1

 

As pedras transpiram lágrimas

infernais.

queimam os olhos feitos de sal

dão

as pastas de medo tracejadas pelo lirismo do isolamento

(d)as flores que morrem

nos calcanhares das manhãs

 

 

2

 

Dentro da circunferência as plantas

infrutíferas fabricam ramos de ferro

que amarram ou enrolam as flores apedrejadas

pelo ardor da régua tempestade

onde as suas folhas abrem-se para

a arqueologia do voo rasante do

silêncio.

 

 

3

 

Na circuncisão da

noite

escapam lágrimas enlouquecidas

pela dor do parto à

cesariana

 

 

4

 

Traçar a fogueira das madrugadas

em volta

dos acres espinhos

refinados pelo escuro

dilema da morte

a costurar-se nos semáforos do tempo.

 

 

5

 

Na gélida folhagem

as sementeiras

agudas

da memória

poisam serpentes

de cérebros esburacados

por submarinos da solidão

 

 

6

 

O silêncio

dispensa

o carnaval dos choros

e em

seguida

conquista

a ausência com o desejo

de electrocutar a chuva

o abismo

 

 

7

 

E por fim

os homens trovejam esperanças

na folha em branco de geometrias

infernais

em pleno cataclismo do abandono

içada

ao alto

no horizonte das lágrimas estateladas

na sólida estrada da solidão .

 

 

8

 

A nostalgia soçobra nas sombras do mar

uma noite deserta de silêncios lateja

nos infinitos ouvidos do poço

fora do núcleo terrestre

as pedras voam em direcção

ao fim da partida

como um barco sem leme

a procura do exílio nas portas do vento

 

 

 


Créditos na imagem: Reprodução: Foto: Jorge Meis.  Sal en la memoria. Nostalgia del mar, 2020.

 

 

 

SOBRE O AUTOR

Amosse Mucavele

Amosse Mucavele nasceu em 1987 em Maputo, Moçambique, onde vive. Poeta, curador de festivais literários em Moçambique e Portugal, jornalista cultural, coordenador do projeto de divulgação literária “Esculpindo a Palavra com a Língua”, foi chefe de redação de “Literatas – Revista de Literatura Moçambicana e Lusófona”, diretor editorial do Jornal O Telégrafo, Editor Chefe do Jornal Cultural Debate, Editor de Cultura no Jornal ExpressoMoz, Colaborador do Jornal Cultura de Angola e Palavra Comum da Galiza – Espanha. É coordenador nacional da Wolrd Poetry Movement, membro do Conselho Editorial da Revista Mallarmargens (Brasil), da Academia de Letras de Teófilo Otoni (Brasil) e da Internacional Writers Association (Ohio – USA). Tem participado em inúmeros festivais literários em Angola, Portugal, Brasil, Argentina e Mexico. Com textos publicados em diversos jornais do mundo lusófono, publicou os livros: “A Arqueologia da Palavra e a Anatomia da Língua – Antologia Poética”, Revista Literatas, 2013 (coordenação) e “Geografia do Olhar: Ensaio Fotográfico Sobre a Cidade” (editora Vento de Fondo, Córdoba, Argentina, 2016), livro premiado como Livro do Ano do Festival Internacional de Poesia de Córdoba; no Brasil (Dulcineia Catadora Edições, Rio do Janeiro, 2016); em Moçambique (Cavalo do Mar, Maputo, 2017) e Pedagogia da Ausência (Alcance Editores, Maputo, 2020).

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