Liquida-se um poeta.
As estantes estão cheias
e é já tempo das novas ofertas.
Liquida-se um poeta.
Nem novo nem velho,
nenhuma marca de uso,
apenas do tempo:
alguma poeira sobre,
algumas marcas de oxidação,
algumas leves manchas,
mas nada que comprometa,
que avarie a integridade.
Liquida-se um poeta.
Um desses comuns,
sem mais pormenores.
Desses sem escola nem manifesto
(só seu doído haver é manifesto),
poeta de aldeia,
sem distinto sangue ou linhagem.
Um poeta das gentes do barro,
rústico,
sem as luzes magníficas das metrópoles,
sem as cenografias corporais dos holofotes,
sem a eloquência das etiquetas,
sem a pósneopoética dos midiáticos.
Liquida-se um poeta,
apenas.
Quem o leva?
Colaborem!
Facilitamos tudo! Custo simbólico!
Aproveitem a oportunidade!
Carecemos de espaço.
As estantes estão cheias
e é já tempo das novas ofertas:
biografias de new myths
(como o Evangelho segundo Messias Basilisco),
vidas de digital influencers
(porque uma língua ditosa
diante do espelho em nudo corpo
vale mais que mil poetas),
guias de viagem a exotic people
(com dicas para o melhor aproveitamento
do olhar tristonho de criancinhas refugiadas
para self),
manuais de new poetic coaching
(Baixe no App e veja como
é rápido e fácil! Tudo só depende de você!
Parcelamos em até seis vezes no cartão.),
etc…
Liquida-se um poeta –
essa extemporânea coisa sentinte
sem mais(–)valia
nesse mundo liquidado.
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