Alguém já comparou os diários a barômetros da alma. Ali, são medidos os movimentos da consciência, as tensões entre o certo e o errado, os sonhos e frustrações, a banalidade do cotidiano. Na II Grande Guerra, essa banalidade foi feita de sono, fome, vinho e fogo. Com extrema sensibilidade e talento de historiadora Cristina Feres acompanha a exigência interior de um jovem soldado de Ribeirão Pires que se dá a ler e conhecer através das páginas de seu diário. Ele o faz numa época terrível: a campanha da Itália que levou pracinhas brasileiros a enfrentar os temidos soldados alemães nos últimos anos do conflito e que acabou por empurrar Waldemar Reinaldo Cerezoli para um campo de concentração. Lá ele viu o fluxo de sua vida suspenso e a banalidade do cotidiano passou a ser feita de fome, frio e dor.
Foram cinco meses de confinamento com mais de 110 mil capturados de 24 origens diferentes. O arame farpado o isolava do mundo. Comia neve para “enganar o estomago”. Seu corpo, “cobria-se de bichos”. Ele sobrevivia, mas sua juventude ficou enterrada na batalha de São Quírico. Calou-se, então, o escritor. A rotina de violência e humilhações não mais cabiam em palavras. A concentração do soldado, a franqueza como característica de sua escrita, a ausência de ligação entre um dia e outro, a ancoragem no presente imediato permitiu a Waldemar desvelar seu íntimo, mas também registrar um dos momentos mais cruéis e desumanos do século XX. Sua pena desenhou as muitas faces do conflito, mas também, o que lhe ia no coração e na mente: “Infelizmente, a guerra é assim”.
Terminada a guerra, libertos pelo general Patton, Waldemar e outros prisioneiros foram levados à França. Ali, encontraram de novo a humanidade. Levados de volta à Itália, foram recebidos com alegria pelos companheiros que os julgavam mortos. Como bem diz Cristina, “Sim, Waldemar estava vivo, mas preso para sempre num mundo de sofrimento. Após ter testemunhado tanta dor, as imagens dos colegas que tombaram aos seus pés ainda estavam ali vivas, bem como os sons dos gemidos e gritos de angústia a assombrar suas noites, fazendo-o reviver na intimidade solitária os momentos mais dolorosos de sua vida e transformando em pesar o simples ato de dormir”.
Graças a Cristina Feres, recupera-se um protagonista de nosso passado, um herói desconhecido de nossas guerras. Graças a ela, Waldemar encontra uma escuta. Num texto límpido e apaixonante, Cristina o traduz, acompanha seus passos, recupera o fio de sua história, desvelando, também, parte da nossa.
Ficha Técnica
Livro: A dupla face da guerra: A FEB pelo olhar de um prisioneiro
Autora: Cristina de Lourdes Pellegrino Feres
Editora Intermeios
Data de Lançamento: 26/11/2023
Local: Livraria Martins Fontes Paulista
Endereço: Avenida Paulista, 509
Horário: 15h às 18h
Serviço
Cristina Feres: cristina@verticecomunicacao.
(11)98364-7412
Instagran: @crhistoriadora