O pequeno príncipe, de Antoine De Saint- Exupéry, foi publicado pela primeira vez em 1943, e, tornou-se o meu livro preferido em 2003, quando eu ainda estava na terceira série. Por quê? Eu não me lembro, confesso que a memória que tenho dos meus noves anos de idade não é muito detalhista, mas eu sei que gostei muito da história e que a li algumas outras vezes. Bom, nesse ano eu decidi ler novamente a história daquele principezinho, procurava pura distração, mas me surpreendi com certa passagem da narrativa e com um problema que não me sai da cabeça.  E como as cartas abertas estão famosas na internet, pensei: Porque não me arriscar? Esta é uma carta aberta ao pequeno príncipe.

 

“Há milhões e milhões de anos que as flores fabricam espinhos. Há milhões e milhões de anos que os carneiros as comem, apesar de tudo. E não será sério procurar compreender por que perdem tanto tempo fabricando espinhos inúteis? Não terá importância a guerra dos carneiros e das flores? Não será mais importante que as contas do tal sujeito? E se eu, por minha vez, conheço uma flor única no mundo, que só existe no meu planeta, e que um belo dia um carneirinho pode liquidar num só golpe, sem avaliar o que faz, – isto não tem importância?! Corou um pouco, e continuou em seguida: – Se alguém ama uma flor da qual só existe um exemplar em milhões e milhões de estrelas, isso basta para que seja feliz quando a contempla. Ele pensa: “Minha flor está lá, nalgum lugar…” Mas se o carneiro come a flor, é para ele, bruscamente, como se todas as estrelas se apagassem! E isto não tem importância?”

 (O pequeno Príncipe, Antoine De Saint- Exupéry)

 

Querido Pequeno Príncipe, como vai?

 

Como andam as coisas em seu pequeno planeta? Tem observado muito o pôr do sol como fazia antigamente? Tem viajado? Ah! Voltou à Terra? Espero que não esteja na Terra neste momento, estamos passando por sérios problemas, das mais diferentes naturezas, você se assustaria. Sei que não conversamos há muito tempo, sei que parei de lhe escrever, acho que foi exatamente na mesma época em que parei de analisar os desenhos do “biscoito passatempo”. Eu tenho mais pressa, tenho mais coisas sérias para fazer, me preocupo com os números às vezes… acho que eu posso ter me tornado um cogumelo também.

Mas enfim, quero lhe dizer que não me esqueci da sua história. E quem poderia se esquecer de um amigo da infância? Eu ainda gosto de livros e talvez você tenha uma grande responsabilidade nisso. Outro dia estava um pouco cansada dos meus livros de gente adulta, e por isso, decidi me voltar a você, relembrar as suas aventuras. A sua história não é extensa e conta com muitas ilustrações, imaginei que terminaria até o almoço. Mas acontece que já são duas e quarenta e cinco da manhã, e cá estou eu pensando em você. Não passei da página 17. Travei como uma criança que encontra uma pergunta e não consegue desistir dela. Meu amigo me esclareça, por favor: O que é que você quis dizer quando falou sobre a guerra dos carneiros e das flores?

Sabe, talvez seja bom refrescar a sua memória. Lá estava você conversando mais uma vez com o aviador, e de repente você o pediu que desenhasse um carneiro. Não poderia ser um carneirinho doente e nem muito velho, deveria ser perfeito para comer os Baobás que crescem em seu planeta. Todos sabem que os Baobás são plantas que devem ser arrancadas ainda pequenas, depois de grandes são capazes de destruir qualquer lugar com as suas raízes profundas. Um carneiro que come Baobás poderia finalmente resolver o seu problema, no entanto, você tinha uma flor.

E se o carneirinho a tentasse comer? Os espinhos a protegeriam? Poderia pedir que o aviador desenhasse uma pequena mordaça, mas bastava se esquecer de colocá-la por um único dia para que… Havia “milhões e milhões de anos que as flores “fabricavam os seus espinhos, e “milhões e milhões de anos que os carneiros” continuavam a comê-las. E se os espinhos não as protegiam e não as impediam de morrer, porque é que elas ainda permaneciam nessa labuta? E muito além de tudo isso, o que elas ganhariam se não fosse assim? As flores preferem morrer com seus espinhos, a morrer sem os terem fabricado. Vale a pena perder uma noite pensando nisso. E você ficava cada vez mais triste e nervoso, porque mesmo diante de todo esse problema, o aviador ainda se preocupava muito mais com o avião, com os parafusos, e com as “coisas sérias”.

Todos os dias um carneiro mata uma flor, e como essa guerra pode ser menos importante, não é meu príncipe? Finalmente as histórias sobre parafusos e aviões parecem interessar um pouco menos, mas quem nos poderia culpar por isso? Os espinhos podem até machucar, podem imprimir certa imagem e medo, mas confessemos, não são suficientemente fortes, a boca do carneiro é sempre maior. As flores estão desprotegidas e continuam a morrer. Precisamos falar mais sobre este assunto. Você meu caro príncipe, amava uma flor e talvez seja por isso que as suas lágrimas naquele dia tenham sido tão sinceras, eu amo tantas flores aqui em meu planeta, não poderia deixar de te entender.

E se amanhã a minha flor estiver despedaçada? E se for a sua? E se for eu da próxima vez? Ah por favor, eu concordo com você meu pequeno, preocupemo-nos um pouco mais com estes assuntos consideramos um pouco “menos sérios”, e quem sabe assim consigamos convencer aos carneiros a comerem apenas os Baobás. Quem sabe assim, consigamos desenhar espinhos mais resistentes. Quem sabe apenas entendamos que de fato elas precisam de proteção, quem sabe consigamos…. Quem sabe assim as nossas conversas interessem um pouco mais.

Passaram-se 17 anos desde que nos encontramos pela primeira vez, e você permanece sendo responsável por tanta coisa por aqui. <3 Talvez o tenha de fato cativado. Obrigada, mal posso esperar pelo nosso próximo encontro.

 

Com carinho,

ana.

 

 

 


Créditos na imagem: O GLOBO / Disponível em: https://blogs.oglobo.globo.com/paris/post/autor-de-o-pequeno-principe-esteve-varias-vezes-no-brasil.html

 

 

 


[vc_row][vc_column][vc_text_separator title=”SOBRE A AUTORA” color=”juicy_pink”][vc_column_text][authorbox authorid = “143”][/authorbox]