I
Em Ouro Preto
Não há praças.
As escadarias
São bancos.
Os largos das Igrejas,
São playgrounds.
II
Na garoa ouro-pretana
Molhei minha casaca,
Escorreguei entre as pedras,
Precipitei-me nas ladeiras.
A chuva fina,
Seu sereno grosso,
Molha meu cabelo,
Se enche de gotículas.
Tiradentes toma friagem
Do alto de seu pedestal.
Aqui em baixo,
Escondendo-me na marquise
De um casarão,
Uma tosse me aparece,
E um espirro me balança.
III
O sol de Ouro Preto,
Racha meu coco,
E feito louco
Derreto-me por inteiro.
Abaixo de uma pedra grande,
A lagartixa branca
Esconde-se,
Já bronzeada:
Cansada
De tanto calor.
IV
Pra mim,
Ouro Preto é Saramenha:
Aquele cheiro e aquela cor.
Aqueles muros preteados pelo tempo.
Aquelas senhoras com panos no cabelo
Carregando entre os braços alguma coisa;
Presente aos vizinhos.
Aquela cara de Vale, Samarco e o escambau,
Aquele cheiro de minério,
Aqueles riachos tóxicos,
Aquela exploração desnuda,
E desenfreada.
É Saramenha,
Na minha mente louca.
É aquele chão rochoso,
Aquele mato verde empoeirado.
Aquelas sucatas de carro,
Enferrujadas, e jogadas em um terreno vazio.
Ouro Preto é aquilo,
Uma nostalgia estranha.
Créditos na imagem: Reprodução: Ouro Preto, 1951
Guignard
Óleo sobre tela
40,10 cm x 50,10 cm
Coleção Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo
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